Hoje peço Coração



Quase todos os dias passa à minha porta. 

Pára, cumprimenta com um grande sorriso e fica, tentando comunicar comigo. Lá conseguimos, quando me lembro de ser simples e de perceber para lá das palavras, pois não há verbo a unir-nos, que ele veio do Paquistão pela força dos braços e da vontade, e eu não pesco nada de ”asiático”.

Deixa-me sempre um sorriso e alperces.

Outro dia mostrou que lhe doía muito as costas, do trabalho duro, e que não tinha dinheiro. Implorou ajuda. E eu ofereci aquilo que de melhor sei fazer.

Foi como se tivesse o mundo ignorado nas mãos. As pessoas que sofrem, que são usadas como se fossem coisas. Quer dizer, na verdade há gente em circunstâncias ainda muito piores… Só tive uma parte delas.

As costas com tantas dores, a lombar inflamada, os ombros e omoplatas muito inchados. Isto num corpo magro de pouco mais de 30 anos, num ser absolutamente gentil. Largado no Alentejo para trabalhar nos campos, ganhando miseravelmente e sem apoio de espécie alguma.

Ia dormitando, como um bebé, e quando acabei ficou. Fui à minha vida e deixei-o ficar. 

Quando voltei estava deitado de lado qual menino pequeno, de olhos fechados. Foi preciso “arrancá-lo” ao conforto. Agradeceu muito, rezou e encheu-me de alperces.

(Os muçulmanos não são aquilo que no Ocidente se costuma dizer. A pessoa comum é doce, humilde, generosa, imensamente respeitadora.)

Que estranho é o mundo. Uns têm tanto e outros tão pouco. Tratam-se as pessoas como objectos velhos, sem préstimo, sem merecimento.

Não sou de cá!

Se tiver que pedir alguma coisa a Deus é Coração para toda a gente. Para que cada ser possa ser respeitado de igual modo. Para que nenhum homem assuma vantagem sobre outro. Para que nenhum ser humano inflija sofrimento a outra criatura.

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